Voltei. Aceno aos troncos, meus velhos amigos, de olhos esbugalhados e dentes abertos, mãos esticadas em ramos para nos arranhar. Tropeço nas raízes que as árvores esticam de propósito e vou de cara ao chão. Engulo a terra que é tão porca quanto eu, cuspo as folhas cobertas de um pó que não sabemos muito bem se é droga, se é veneno ou se é a secreção que deixam os infelizes.
Esta noite eu sou mais uma, sou como vós, somos tão sozinhos na mesma solidão e tentamos visualizar a mesma lua que as copas escondem. Ninguém nos dá um desconto por termos ficado fora tempo demais e por já não sabermos caminhar tão bem quanto antes, nos trilhos da mata. Caímos em armadilhas, os ferros cravam-se nos nossos tornozelos e nós esperneamos e gritamos e choramos e esgotamos o sangue sobre o chão. Somos comida de mula velha que nos cospe em seguida e morre infectada. Somos o que somos, mas regressei, regressaram alguns, outros perderam-se nos buracos.
As corujas piam e eu escuto, desejosa de congelar. Está frio, tanto frio! O nevoeiro cola-se-me aos olhos e troça por eu não saber onde coloco os pés. Sem ver por onde vou, eu vou onde vamos todos. Cheiro a suor, cheiro a sal, cheiro a decadência no ar. Isto sou eu, isto somos nós, sem tirar nem pôr.
Queria sair, mas da mata ninguém sai (não verdadeiramente). Dei umas voltas pela clareira e na clareira fiquei tanto tempo que me esqueci das suas grades. Não vi as delimitações feitas de madeira, não vi que as árvores ainda projectam sombra ao sol, não percebi que o ar que respirava tinha um leve tingimento a podre.
Estive tanto tempo na clareira que julguei ter saído da mata, esquecendo-me que já cá nasci e cá morrerei.
(Bem-vinda de volta, quão mal tens passado?)
Etiquetas: desordem da personalidade, mata
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