olhos embaçados sobre mim,
e eu continuo no meu canto da rua, na minha esquina, encostada ao poste.
que vergonha, cantarolas
(nunca repreendes em tom sério)
e lá vou eu, quase caio, os meus saltos a pisarem descuidadamente a rua.
a esta hora, só mulheres e gatos
e tu no meio
e eu também.
precisas de ajuda?
claro que preciso; és o meu apoio pessoal
e podíamos fingir que estávamos num romance vitoriano,
estende o braço
a minha mãozinha delicada, escondida pela luva de cetim
(que luva, porra? estás quase nua)
não estou não, mas era o mesmo se estivesse.
só infelizes e gatos e mulheres e tu, como já disse. então eles olham para mim, mas não me vêem — acima de tudo, eles não te vêem, que é o mesmo que dar-te a permissão para me atirares à sarjeta mais próxima.
(eu diria que talvez se fosse um gato...mas animais e mulheres recebem o mesmo tipo de tratamento nesta calçada)
que vergonha, não tens vergonha?
sabes que as tuas repetições não me vão trazer ao cimo. eu ainda tremelico pela noite fora e as bolhinhas ainda me enchem dos pés à cabeça. é tão bom na minha nuvem, para quê descer?
tu não te importas, não realmente. tanto se te dá se é vergonha ou acto de boa moça, tanto se te dá se esfolo os joelhos ou se vomito nas pedras — ah, sim, estarás lá para me segurar o cabelo, mas isso não te dá o mérito de bom moço.
por isso continuamos. eu pobre de bêbada (ou bêbada de podre?) e tu no meu encalço, sem que ninguém se atravesse no meio (só o ocasional gato vadio).

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