- Sebastian, you're in a mess.
E estava. Tudo nele, até ao mais mínimo pormenor, tinha descarrilado; se pegasse nos livros por mais de cinco segundos era motivo para comemorar, sair de casa estava fora de questão e a simples tarefa de trocar de roupa era-lhe de extrema dificuldade...ver a namorada, então, era mesmo impensável. Por isso, os pais ignoravam - era uma crise que devia passar - e a prima limitava-se a colocar-lhe a comida sobre a mesinha-de-cabeceira ou ele não se moveria nem para saciar a fome.
- Vamos dar uma volta, anda.
O rapaz enterrou-se mais confortavelmente entre os cobertores de inverno e as largas almofadas de penas. Parecia não escutar o que o rodeava ou, pelo menos, estava concentrado na tarefa de se assemelhar a um surdo.
Giselle avançou furiosamente na direcção da cama e, alertado pelo súbito ar de raiva que a prima exibia, Sebastian viu-se obrigado a sentar-se na cama e olhá-la em expectativa. A morena continuou a caminhar com a mesma firmeza, até o alcançar e lhe pregar uma palmada na parte detrás da cabeça com toda a força que encontrou.
- Ai! - queixou-se o agredido, levando a amedrontada mão à nuca vermelha.
- Levanta-te já.
Sebastian captara um deslize dos olhos da prima na direcção do candeeiro e, apesar do olhar ter durado apenas meio segundo, foi o suficiente para ele se convencer de que as coisas poderiam piorar se ele não tirasse os pés do colchão. Levantou-se para lhe fazer a vontade - principalmente pelo medo de sofrer represálias - e encaminhou-se à casa-de-banho. Ainda assim, a sua visão não foi dirigida à familiar para deixar bem claro que ele não estava motivado, nem disposto a procurar qualquer réstia de entusiasmo.
Depois de demorar tempo absurdamente desnecessário no quarto-de-banho, o moreno retornou ao quarto, onde Giselle permanecia de braços cruzados sobre o peito. Ele estacou sobre o chão recentemente polido pela empregada e fitou-a como se dissesse que estava pronto.
- Sinceramente, Sebastian. Pelo menos sai do fato de treino e passa um pente pelos cabelos...pareces um mendigo!
O rapaz encolheu os ombros e arrastou os pés até ao armário. Depois dela sair, tornou a fazer-lhe a vontade, embora tivesse feito de propósito para não envergar nada de muito chamativo.
Foi arrastado até a um café ao virar da rua; agradeceu aos céus por não lhe arruinarem os planos de monotonia profunda, uma vez que lhe era muito mais fácil amuar nas redondezas que num centro comercial a abarrotar de estranhos. Ocuparam mesa a um dos cantos e foi um grande custo para a empregada compreender o pedido que Sebastian fizera entre dentes.
Os olhos do rapaz deambularam discretamente pelo espaço, pousando numa figura franzina que se encolhera na esplanada. Estava atirado para a cadeira de uma forma que levava a crer que o jovem não tinha boas maneiras, pelo que teve de se endireitar subitamente para conseguir vê-la melhor através do vidro.
- Hey, não vais ligar à Stacy?
Ignorou a pergunta da prima e encostou a lateral de ambas as mãos de cada lado do rosto com a cara quase colada na janela. Semicerrara as pálpebras para conseguir enxergar melhor, mas precisara mesmo das mãos para taparem o reflexo do sol que embatia no vidro.
- Opá, estás a ouvir?
Mas Sebastian estava mais interessado na rapariga que tremia e se desfazia em lágrimas do outro lado do café.
- Que é que lhe aconteceu? Chateou-se com o namorado? - questionou retoricamente, ainda interessado na sua observação.
Giselle reparou também no objecto de interesse de Sebastian e sorriu ligeiramente; nunca gostara ou se relacionara muito com a moça, mas as notícias corriam velozes.
- Pode dizer-se que sim. Ele pegou nas coisas todas e saiu de casa...a Lucy viu-o a ir embora com a mota.
- Porquê?
Era estranho, eram um casal antigo e estável ou, pelo menos, assim aparentavam. Nada como Sebastian e Sophie, a sua boneca de plástico que ele não conseguia entender muito bem como lhe chegara às mãos.
- Dunno. Maybe he stopped loving her today.
O rapaz perdeu a concentração e tornou a esticar as pernas sob a mesa para mergulhar numa nova onda de silêncio enfadonho. Quando chegasse a casa, ia trancar a porta do quarto e criar um buraco na madeira por onde a comida pudesse entrar. Assim, era alimentado, mas não tinha de temer agressões por parte da prima, nem suportar coações para sair de casa.
está uma grande estupidez, eu sei. fui eu que me lembrei de fazer um texto a partir da primeira frase de uma música e da última de outra que ouvisse.
Etiquetas: contos-de-fadas
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