Eu odiava-a; muito sinceramente, não tinha o mínimo interesse pela minha protagonista. Até que a conheci, entrei-lhe dentro da pele, mais do que planeá-la e escrever num papel que ela tinha olhos cor de avelã ou que raramente falava. Foi preciso conhecê-la para gostar dela e foi preciso tempo para isso acontecer.
Conhecer uma personagem não se resume a descrever uma imagem ao pormenor e não basta decidirmos que ela vai ser carismática ou que vai ter uma personalidade forte para passarmos efectivamente a cumprir com essas características e a apreciá-las. Às vezes, é tão fácil quanto sentarmo-nos diante do ecrã e despejarmos uma quantidade incrível de informação sobre alguém que, tecnicamente, nunca vimos mais gordo, mas que, por algum motivo que escapa à minha compreensão, nos sussurrou ao ouvido a biografia. Outras vezes requer tempo e paciência. Geralmente acontece-me mais com as personagens femininas...é o despender de horas de frustração a olhar para a página em branco e a pensar porque raio tenho de criar meninas. Mas como eu não escrevo slash tornar-se-ia complicado um mundo só povoado por homens, não é?
Penso que o necessário para se entender - e já não falo em "gostar" de uma personagem, porque isso é relativo e não há a obrigatoriedade de tal, ainda que eu não consiga não sentir afecto pelas minhas criações - é realmente usar a personagem. Pessoalmente, só conheci a Lalla depois que comecei a escrever com ela e, à medida que a história se desenvolveu, o meu conhecimento sobre ela desenvolveu-se também. Se primeiro era tudo muito frívolo e havia a necessidade de seguir o que dizia o
guião, depois passou a ser a descoberta em primeira pessoa. Há dias em que a detesto, e isso é bom porque nenhum ser humano é fixo e se o objectivo da literatura for a credibilidade, é bom que a protagonista tenha falhas e que seja tão cansativa, quanto consegue ser cativante. Há que amar e que odiar, mas, principalmente, que sentir a personagem - isto para o escritor e para o leitor.
Portanto, depois de linhas e linhas de divagação, o meu conselho é só mesmo que escrevam com o sujeito. À medida que este for confrontado com novas personalidades e circunstâncias, formar-se-á uma pessoa concreta e não haverá tanta dúvida ou desapego emocional pela criação.
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